Sobre mim
Escrever é o meu modo de existir. Tudo é ortografia e sentido. Ora as palavras destroem os sentimentos, ora os sentimentos suplantam as palavras. Escrever é esse exercício angustiante de resistir dentro do próprio discurso. Posso dizer que estas são minhas anotações de escriba, sentada às portas de uma Jerusalém, esperando a entrada de um Deus que não chega.
Depois da pandemia, ficou difícil enxergar o mundo com nitidez. Um redemoinho sopra as palavras com muito mais força e elas vão se misturando à areia, ao pó das coisas mortas, às lágrimas dos dias entristecidos, ao sal das saudades, aos ossos das ilusões, às vértebras das descobertas insondáveis e ao vermelho por trás das pálpebras.
Para me salvar do afogamento em terreno seco, para não ser náufraga dos meus próprios olhos, deixei escorrer essas páginas sobre as incertezas, sobre o medo e o tempo a se consumir em espiral. Tentei resgatar dos escombros a parte bela das coisas. Mirei longe. Cervantes, Santa Tereza de Jesus, Fernando Pessoa e outros que viveram situações tão desastrosas quanto à nossa. Vi as palavras me acenando, dizendo que eu poderia me locomover, poderia seguir esse itinerário que vai muito além do que eu vivo.
Aceitei cegamente o desafio de tentar e deixei voar a pena. Fui criando uma vitrine para expor ideias que me vêm deles. Clarice Lispector, Baudelaire, Emily Dickinson, Cecília Meireles e tantas outras literaturas que se buscam e se desejam mutuamente. Elas se abraçam na construção de um tecido inviolável com o qual agora me revisto e resisto.





